Com
a perda do sentido lírico das coisas que a música e a poesia nos sugerem, a
humanidade, em sua grande parte, enveredou pelos caminhos do imediatismo de
tudo aquilo que é efêmero e diluível pelo tempo. Um século antes, o mundo
terrestre era mais lírico.
A tristeza era transfigurada como a luz do luar, em noite esplêndida, encantando os ambientes. O lirismo tem esse encanto de transmudar aquilo que parece ser em outro estado de consciência inferior. Sem determos nesse estado, pois nos levaria a encontros e desencontros, e nos fixamos apenas naquilo que nos dá estabilidade emocional.
A melancolia dos antigos gregos, hoje, recrudescida nos sintomas de depressão bipolar, cresce a passos de galope nesta grande parcela da humanidade de consciência dissociada, a consciência que está indo embora do planeta Terra, como temos dito no blog www.fernandopinheiroescritor.blogspot.com
A morte física ainda é um transtorno que tira o conforto de uma vivência que estava oscilando entre os prazeres momentâneos e os lampejos de uma realidade única que todos possuímos.
Afastando-se da consciência fragmentada, a poetisa Cecília Meireles, filha de Carlos Alberto de Carvalho Meireles, funcionário do Banco do Brasil, e de Matilde Benevides, professora municipal, ao dizer que não é alegre nem triste, rimou, no poema Motivo, a vida completa que ela tinha por ser poeta e elucidou, no poema Atitude, a morte como transfiguração: "O último passo do destino / parará sem forma funesta / e a noite oscilará como um dourado sino / derramando flores de festa."
A nossa poetisa maior espraiou os olhos sobre espelhos, alcançando caminhos que a transparência revela e estendeu seu olhar sobre um campo de estrelas cintilantes, evocando lembranças ardentes.
Freud, o psicanalista que fundou escola ainda seguida pela Psiquiatria, identificou a perda como sinal do que se chama hoje de depressão. Nesse sintoma está incluída a perda, erroneamente propalada, de pessoas. Acreditamos que perdemos as coisas e não as pessoas.
Nesse caso, as pessoas são niveladas por coisas e, já que chegaram a esse nível de subestima, são compensadas financeiramente por pecúlios ou seguros de morte que lhes trazem satisfação de continuar a executar planos de consumo. A herança corre nesse mesmo nível de apreciação das coisas e, muitas vezes, é motivo de separação de entes consanguíneos que desejam maior parcela na partilha de bens.
O retorno, que se encaminha na busca de si mesmo, é ainda o melhor caminho.
A essência etérea e clara,
demonstrada por Cecília Meireles, no poema Vinho, no livro Viagem, pode
desaparecer ou deixar de ser percebida, nesta visão transitória das coisas,
inclusive nos contatos pessoais onde há relacionamentos pessoais ou sociais.
Quem pôde ver irradiações luminosas
na Sonata ao Luar, de Beethoven, ou na ária de Gluck que a TV Globo levou ao
ar, dia 7/6/2013, na cena da novela Amor à Vida em que os personagens César
(Antônio Fagundes) e Pilar (Susana Vieira) vão ao teatro, ou ainda quem já
sentiu o luar dentro de si quando a tristeza é transfigurada? Quem não viu nada
disso pode estar vivenciando a experiência que a depressão faz ao se encampar
em espaços permitidos.
Quem já se encontrou ao entrar em
contato com os caminhantes errantes pode ter o caminho desviado se a firmeza
recém-instalada oscilar sobre o comportamento repetitivo que lhe mostrou caminhos
incertos. A taça pode ser brilhante, mas o vinho pode conter desencantos.
Olhemos tudo e silenciemos. Não
criticar, não comentar, nem dar ouvidos a comentários para não cair em
reflexões que saem pela porta aberta à procura de parceiros invisíveis. Na
noite correm setas invisíveis, no dizer do rei Salomão.
As irradiações luminosas estão nos
mundos felizes e no planeta Terra no coração de quem ama e se libertou dos
engramas que fazem a reciclagem dos sofrimentos na transmutação que traz a luz
do luar sentida interiormente.
www.fernandopinheirobb.com.br
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