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sexta-feira, 4 de dezembro de 2015

ONDE VOCÊ VAI?

Atores radicados na capital paulista, Luiz Serra e Berta Zemel têm longa experiência no palco, no cinema e na televisão e juntos interpretaram, nos idos de 2010, Elias e Sônia, um casal de idade avançada vivendo num apartamento ambientado no filme de curta-metragem Onde Você Vai?
A trilha sonora traz a música Qual foi o mal que eu te fiz?, de Cartola e Noel Rosa, cantado por Francisco Alves, o rei da voz, e ainda Nina Simone que canta Who knows where the times goes, de Sandy Denny. Essa música carioca surgiu nos idos de 1932, trazendo uma pergunta ao mesmo tempo uma resposta para desfazer a mentira que destroi um grande amor: “mas se eu não tenho remorso, o meu coração não dói.”
De maneira singela, Sônia cantarola a música Mensagem, de Isaurinha Garcia: “quando o carteiro chegou com a carta na mão. Ante a surpresa tão rude, nem sei como pude chegar ao portão.” Essa canção é muito linda e mereceu, em épocas distintas, o prestígio na voz de Vanuza e Maria Bethânia. Diante de uma verdade tristonha ou de uma mentira risonha, a canção diz que ela não abriu a carta para não sofrer mais.
A curta diz que o enredo é baseado em fatos reais. Em breve diálogo, vemos as lembranças fragmentadas do passado, quando ela lhe pergunta, depois da refeição: “nós já almoçamos?”. A seguir, ela olha para o antigo relógio de parede dizendo que se lembra quando o relógio estava na casa do pai dela e, com sorriso de satisfação, diz que o pai era muito bonito e elegante.
Depois, ela se dirige a Elias: “você se lembra quando fomos ao Japão? Ele lhe responde: “não foi Japão, foi Lindoia. Ela lhe diz: “como eram lindos os nossos filhos!” Ele lhe diz: “não tivemos filhos”. No íntimo, ela está feliz ao lado dele e, na sala fechada, exclama: “que bela paisagem, somos abençoados”.
Elias, preocupado com o passar das horas, olha o relógio de parede que toca as horas, o horário de tomar e de dar remédio a esposa, de ler o jornal. Chega a um ponto em que ele desliga o relógio, demonstrando ponto final na preocupação.
Seguindo com leveza, Sônia não guarda nenhum remorso como diz a canção de Francisco Alves e no embalo que traz a música de Sandy Denny: “eu sei que eu não estou sozinha, enquanto o meu amor está perto de mim, eu sei que é assim até que é hora de ir. Quem sabe onde o tempo vai?”
Quantas pessoas, mesmo aposentadas, ainda se debatem com horários e com as tarefas que tinham, e se estão num passeio no campo ou na praia levam o celular ou computador para se comunicar com os amigos nas redes sociais! Ninguém sabe a hora de partir.
A seguir, transcrevemos o assunto que envolve o filme Onde Você Vai?, ressaltando algumas apreciações constantes da crônica ALZHEIMER – 9 de novembro de 2014 – blog Fernando Pinheiro, escritor:
Para quem não sabe de onde procedem, no plano astral, as lágrimas e o sorriso do encontro do primeiro amor, ter a doença Alzheimer uma oportunidade valiosa para refletir sobre os benefícios que irão surgir, logo após o impacto do primeiro instante do desconforto.
O instante de reflexão tem que ser agora, pois o paciente de Alzheimer, aos poucos, vai perdendo a memória, a fala e os movimentos corporais, a doença é incurável e degenerativa. No entanto, na música Não mereço você, a afirmativa do cantor Agnaldo Timóteo é válida: “sobre os montes de pedras também nascem flores”.
O que prevalece em qualquer situação ou momento é o nosso ser profundo, aquela potência do agir (Jung), a libido (Freud) que não se restringe apenas à área erógena. Não há nada a se preocupar, a preocupação carreia o medo e isto anula o que temos de mais precioso, a fé, não a fé no dualismo humano, onde esta cultura do medo está estruturada, mas a fé em nosso ser profundo que se conecta com a fonte.
Luiz Serra, ator global, de reconhecida notoriedade, Berta Zemel vem atuando na televisão desde os tempos da TV Tupi Rio, assim como as atrizes Nathália Timberg e Fernanda Montenegro, inclusive trabalharam juntas.
Os personagens Elias e Sônia no filme Onde Você Vai?, passam, de maneira sutil e às vezes clara, a ideia de um casal que traz sintomas de Alzheimer. Esta é também a ideia do diretor Victor Fisch que revelou, no blog 100 Filmes (24 novembro de 2010), ser inspirado na vida cotidiana de seus avós, no esquecimento de sua avó e na música da cantora americana.

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