Experimentava o desprezo de seus
compatriotas que lhe segregavam o convívio, alojando–o no Vale dos Imundos.
Teve notícias daquele profeta da Galileia que curou muitos leprosos.
(49) MARCOS, 1:40 a 44 LUCAS,
7:13 a 19
Agora, reencontrando–o de passagem por
Jerusalém, disse: “Senhor, se quiseres, bem podes limpar–me!”. Havia, na
inflexão da voz, uma súplica. A esperança brotava, em seu ser mais profundo,
como se fosse aquele dia a oportunidade única de ficar curado.
Sentindo a dor daquele irmão, o Mestre
apiedou–se e, estendendo a mão, tocou–o e disse–lhe: “quero, sê limpo”. No
mesmo instante, os tecidos degenerados se recompuseram, voltando à normalidade.
A lepra desapareceu.
Impressionado com o seu novo estado de
saúde e, parado, em êxtase, diante da grandeza radiante do Mestre, o leproso,
acanhado, balbuciando, parecia perguntar: “que devo fazer, agora, Senhor?”
“Não digas a ninguém”, respondeu Jesus,
“mas, vai mostrar–te aos sacerdotes e oferece pela tua purificação o que Moisés
determinou, para que lhes servir de testemunho”.
Amélia Rodrigues, no livro Primícias do
Reino, psicografado por Divaldo Pereira Franco, relata o texto final deste
episódio e o comenta à luz da sabedoria:
“O Estranho Rabi tornara–se diáfano.
Uma beleza incomparável dEle se irradiava. Parecia sorrir.
A turba acercou–se, muda de espanto, e
constatou–lhe a cura.
Estuante, emoções em desalinho, saiu a
correr.
Mente em torvelinho, coração
descompassado, voltava à cidade.
Antes, a pedradas fora expulso. Agora,
cantando felicidade, retornava.
Pelo caminho, no entanto, sem poder
guardar silêncio, contava o prodígio de que fôra objeto.
Ω
A noite caíra sem preâmbulos.
À luz das estrelas longínquas o Mestre
reuniu os discípulos, em agradável aconchego.
Chegado a hora do repasto e preparada a
fogueira aquecedora, foram distribuídos pão e peixe defumado. Acercando–se do
Rabi, Simão indagou curioso:
–
Seria necessário que o leproso pagasse o tributo?
–
À lei, os respeitos de justiça, respondeu Jesus.
E desejando esclarecer os companheiros
não refeitos da grande emoção,
prosseguiu:
– Legalmente, ele estava morto. Trazido
à vida, por mercê de Nosso Pai, deverá ser reconhecido por aqueles que
representam a tradição. O tributo, não entendemos como pagamento ou louvor,
puro e simples, mas como expressão de testemunho de reingresso nos estatutos
dos homens.
Espicaçado pela curiosidade, André
indagou:
– Será justa a recomendação de
silêncio? Não se faz necessário que todos identifiquem os sinais da Mensagem de
Vida, para que se disponham ao Reino de Deus que está próximo?
O Mestre espraiou os olhos em derredor,
como a delimitar os sítios onde se encontrava, e redarguiu:
– Não transcorreu muito tempo, eu vos
falei que sois o sal da
Terra... Para que serve o sal se perde o sabor? Diluindo–se no repasto, o sal se faz
presente sem alarde e todos o podem identificar...
E depois de uma breve pausa como se
desejasse caracterizar melhor os dias próximos, esclareceu:
– O Reino dos Céus não fará notado
pelas atrações externas. A Terra sempre foi rica de homens e mulheres
prodigiosos, profetas e rabis, curadores e adivinhos. Acima deles todos, no
entanto, o Filho do Homem há velado.
E esclarecendo melhor os discípulos
incipientes, prosseguiu:
– O leproso de hoje contaminou–se
espiritualmente em pretérito próximo. Ontem, soberbo e egoísta, banhou–se nas
lágrimas dos oprimidos, abusando do corpo como os ventos bravios das tamareiras
solitárias. Retornou aos caminhos de tormento em si mesmo atormentado, para
ressarcir penosamente. O legado que hoje recebeu é de responsabilidade antes
que de merecimento. O Pai misericordioso não deseja a punição do filho rebelde
ou ingrato, mas a sua renovação...
Como se consultasse o leve cicio da
noite, arrematou com um acento de
tristeza na voz:
– Nem todos, porém, podem isto
compreender.
“Neste momento, apalpando as carnes
refeitas, exibe o corpo aos curiosos e fala sobre Aquele a Quem desconhece com
alegria e leviandade. A cura mais importante não a experimentou: é aquela que
não se restringe à forma, e sim ao espírito. Lavada a morféia, ele continua
leproso. Acautelai–vos do contágio das misérias que os olhos não veem, mas que
entenebrecem a razão e perturbam o coração...”
Simão, desejando mais esclarecimentos,
inquiriu com respeito:
– Rabi, se o doente não se pôde beneficiar com
a cura, ter–lhe–ia sido esta de
utilidade?
– Simão, – respondeu, bondoso, Jesus – o Reino
dos Céus é uma mensagem de amor para todos: desalentados e sofredores,
atormentados e enfermos todos receberão o convite de acordo com as suas
necessidades. A nós compete espalhar as dádivas de luz e bençãos, sem a
preocupação imediata de como serão recebidas ou utilizadas. Cada coração é
responsável pelas sementes que recolhe. Fruindo a dádiva de luz, pode escolher
onde entesourar as esperanças. O Sol espraia vida em todo lugar,
indistintamente e, embora o pântano continue pútrido, o astro rei insiste sobre
o seu dorso, onde a peste e a morte se
agasalham, semeando esperança...
Levantou-se e, afastando–se do grupo,
em silêncio, mergulhou na noite, e desapareceu.
A montanha continuava envolta em
sombras, ao fundo.
Enquanto as gemas dos minutos formavam
o colar dos séculos, os acontecimentos daquele dia passavam para os dias do
amanhã sem–fim...” (50 )
(50) AMÉLIA
RODRIGUES – in Primícias do Reino, p.
132, 133, 134 – 4ª edição – psicografado por Divaldo Pereira Franco –
Livraria Espírita Alvorada Editora –
1987 – Salvador – BA. - Autorização concedida ao escritor Fernando Pinheiro por
Nilson de Souza Pereira, presidente do Centro Espírita Caminho da Redenção, em
Salvador–BA, cessionário das obras psicografadas por Divaldo Pereira
Franco.
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