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sábado, 9 de fevereiro de 2013

MADALENA


Primícias do Reino, de Amélia Rodrigues (Espírito), livro psicografado por Divaldo Pereira Franco, revela um traço marcante no comportamento de Madalena:

“De coração generoso, gostava de ajudar e por ser infeliz compreendia a dor dos sofredores e se apiedava da aflição os desditosos. Suas mãos e dedos adereçados derramavam moedas e ofertavam pães, e se as portas da sua casa se fechavam frequentemente aos servos do prazer, seus servos tinham severas ordens de abri-las à dor e ao sofrimento que buscasse ajuda ou guarida.” (66)

(66)  AMÉLIA RODRIGUES – in Primícias do Reino, p. 184 – 4ª edição – psicografado por Divaldo Pereira Franco – Livraria Espírita Alvorada Editora – 9/2000 – Salvador – BA. - Autorização concedida ao escritor Fernando Pinheiro por Nilson de Souza Pereira, presidente do Centro Espírita Caminho da Redenção, em Salvador–BA, cessionário das obras psicografadas por Divaldo Pereira Franco. 

Anteriormente, no século 19, o poeta Fagundes Varela, ao descrever a cena ambientada na casa do fariseu de que nos fala a Bíblia Sagrada, narra em versos o perfil de Madalena. Antes, porém, vale ressaltar que o texto sagrado não menciona o nome da pecadora. Entre os fariseus, pecadora poderia significar mulher prostituta como também aquela que não observava os  costumes farisaicos.

        “Pura, como na infância, abençoada
        Pelo Santo entre os santos, Magdalena,
        Que este era o nome da infeliz perdida,
        Foge dos seus amantes opulentos,
        Entrega aos pobres joias e riquezas,
        Que Satan deparara, e mais formosa,
        Descoberta a cabeça, os pés descalços,
        Acompanha o Senhor por toda a parte.”  (67)   

(67)  FAGUNDES VARELA, L. N. – in Anchieta ou O Evangelho nas Selvas – poema – Canto III – Capítulo XXXIII – pp. 111, 112 – Livraria Imperial – 1875 – Rio de Janeiro – Acervo: Academia Brasileira de  Letras.

O fariseu, rico de valores amoedados, vendo que uma oportunidade rara de receber o rabi da Galileia batera em sua porta, preparou-lhe uma recepção, a fim de se projetar no conceito dos seus patriotas. E, assim, escolheu os músicos, os amigos e parentes para recepcioná-lo.   

O anfitrião estava interessado na repercussão que teria seu nome como um amigo daquele homem que, se triunfasse na política, conforme supunha, ganharia um lugar de destaque ao seu lado.

Aquele povo da Judeia estava ansioso para ter um líder que viesse libertá-lo das algemas de Roma. E o Mestre, possuidor de um poder enérgico e brando, sobressaía diante daqueles que presenciassem suas atitudes elevadas. Até mesmo na singeleza de suas palavras aos camponeses, havia nele uma dignidade que deslumbrava a todos.

Sabendo o que estava ocorrendo na casa de seu antigo parceiro de noites de orgia, a pecadora teve a curiosidade de conhecer aquele visitante que irradiava uma beleza comovente. Mesmo sem ter recebido o convite, conseguiu penetrar no recinto onde estavam reunidos os convidados. Tudo nela estava em desalinho, suas emoções, seus cabelos e suas vestes.

Simão, acostumado às formalidades de recepção, acolheu o ilustre visitante na tentativa de surpreendê-lo em público. Mas a ternura da conhecida mulher era mais forte que os gestos externos de pureza daquele fariseu.

Os minutos e as horas seguidas, naquele ambiente, foram tomados pelas atitudes da pecadora que se libertou das sombras do passado. Numa atitude piedosa e sentindo algo renovador dentro de si, deixou cair lágrimas que se misturavam à água do vaso de alabastro que ela derramava nos pés dele, enxugou-os com seus cabelos sedosos e os perfumou com essências raras.

O fariseu, observando que tudo acontecia sob a vista de todos os presentes, em pensamentos, zombou daquele homem que estava em sua casa e disse só para si mesmo: “se este fosse   profeta, saberia quem é a mulher que o tocou, pois é uma  pecadora”. (68)

Percebendo o que se passava no íntimo do anfitrião, o Mestre amado inicia um pequeno diálogo com Simão. O evangelista Lucas narra:

“Disse Jesus ao fariseu: “Simão, uma coisa tenho a        dizer-te. Respondeu ele: Dize-a, Mestre. Certo credor tinha dois devedores. Um lhe devia quinhentos e o outro cinquenta denários. Não tendo eles com que pagar, perdoou-lhes a ambos. Dize-me, pois, qual deles o amará mais? Respondeu-lhe Simão: Tenho para mim que é aquele a quem mais perdoou. Disse-lhe Jesus: Julgaste bem. Então, voltando-se para a mulher, disse a Simão: Vês tu esta mulher? Entrei em tua casa, e não me deste água para os pés; esta, porém, regou com lágrimas os meus      pés, e os enxugou com os seus cabelos. Não me deste ósculo, mas ela, desde que entrou, não cessou de me beijar os pés. Não me ungiste a cabeça com óleo, mas esta ungiu-me os pés com unguento. Por isso te digo que os seus muitos pecados lhe são perdoados, pois muito amou.  Mas aquele a quem pouco é perdoado, pouco ama. Então Jesus disse à mulher: Os teus pecados te são perdoados.”    (69)

(68, 69) LUCAS, 7:39 a 49  

Uma sensação de espanto e admiração corria nos olhos de  Simão. Acostumado a formalidades em que se evidenciam o engano, ele sentia dificuldade em compreender palavras de    libertação. Os convidados à mesa começaram a falar entre si:  “Quem é este que até perdoa pecados.” (70)

(70) LUCAS, 7:49

A pecadora estava convertida. O amor possibilita o encontro da verdadeira felicidade. Feliz, sentiu-se realizada, e saiu como entrara: a correr, a correr...

W W W

O Canto III da obra Anchieta ou O Evangelho nas Selvas, de Fagundes Varela também revela a narrativa poética acerca da pecadora. Vale assinalar:

        “Toda sua existência, e seu passado
        Esquecidos, ressurtem!... A cabana
        De seus honestos pais, os áureos sonhos
        Da descuidosa e santa meninice,
        O céu azul, as balsas florescentes
        Os serões da família, e... sobre tudo,
        Ai!... a inocência da primeira idade!
        Crenças divinas que alimentam anjos!...
        Tudo isto apareceu! de novo... ao longe,
        À luz de um céu puríssimo, crivado
        De milhares de estrelas refulgentes!...
        Depois, volvendo os olhos a si mesma,
        Examinando as nódoas indeléveis
        Que de su´alma o espelho embaciavam,
        Viu do colar as pérolas mudadas
        Em lágrimas de fogo, e as ametistas,
Os graúdos rubis dos braceletes,
        Em quentes gotas de fervente sangue!...
        Então sobre as espáduas da perdida
        Rebentaram de novo as asas de anjo!
        Em soluços desata, dolorosos,
Lança-se compungida aos pés de Cristo,
        De lágrimas e bálsamos os cobre,
        E os envolvendo nas madeixas negras,
        Os enxuga, prostrada, arrependida.
                        XXXII
– Oh! não!... murmura o fariseu consigo,
        Este mancebo zomba de nós outros!
        Se ele fosse profeta, bem soubera
        Quanto é rasteira e vil a criatura
        Que pranteia a seus pés!  – Jesus o encara,
        E diz estas palavras: – Ouve, amigo:
        Tinha um bom mercador dois devedores;
        Um quinhentos dinheiros lhe pedira,
        Outro apenas cinquenta; pobre ambos
        Nunca puderam lhe pagar tais somas,
        Ele, porém, as remitiu sem queixas:
        Qual dos dois lhe devêra ser mais grato?
– Oh! certamente, o fariseu responde,
        O que maior quantia recebera! – 
        – Julgaste bem, o Salvador prossegue,
        Estou sob teu teto, não me déste
        Para lavar os pés um pouco d´água,
        E nem déste o ósculo fraterno,
        E nem minha cabeça perfumaste
        De bálsamos suaves; entretanto,
        Ela banhou-me os pés com tristes lágrimas,
        Ela os cobriu de beijos incessantes,
        E os ungiu de perfumes preciosos!...
        Por isso agora digo: os seus pecados
        Remitidos estão, amou, e muito!   –
        E voltando-se à humilde pecadora,
        Lhe diz: – Mulher, levanta-te, não chores,
Pois a fé te salvou!  – Assim falando
        Ergue-se e sai da sala do banquete.”  (71)

       
(71)   FAGUNDES VARELA, L. N. – in Anchieta ou O Evangelho nas Selvas – poema – Canto III – Capítulo XXXI, XXXII – pp. 110, 111 – Livraria Imperial – 1875 – Rio de Janeiro – Acervo: Academia Brasileira de Letras.

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