Primícias do Reino, de Amélia Rodrigues
(Espírito), livro psicografado por Divaldo Pereira Franco, revela um traço
marcante no comportamento de Madalena:
“De coração generoso, gostava de ajudar
e por ser infeliz compreendia a dor dos sofredores e se apiedava da aflição os
desditosos. Suas mãos e dedos adereçados derramavam moedas e ofertavam pães, e
se as portas da sua casa se fechavam frequentemente aos servos do prazer, seus
servos tinham severas ordens de abri-las à dor e ao sofrimento que buscasse
ajuda ou guarida.” (66)
(66) AMÉLIA
RODRIGUES – in Primícias do Reino, p. 184 – 4ª edição – psicografado por
Divaldo Pereira Franco – Livraria Espírita Alvorada Editora – 9/2000 – Salvador
– BA. - Autorização concedida ao escritor Fernando Pinheiro por Nilson de Souza
Pereira, presidente do Centro Espírita Caminho da Redenção, em Salvador–BA,
cessionário das obras psicografadas por Divaldo Pereira Franco.
Anteriormente, no século 19, o poeta
Fagundes Varela, ao descrever a cena ambientada na casa do fariseu de que nos
fala a Bíblia Sagrada, narra em versos o perfil de Madalena. Antes, porém, vale
ressaltar que o texto sagrado não menciona o nome da pecadora. Entre os fariseus,
pecadora poderia significar mulher prostituta como também aquela que não
observava os costumes farisaicos.
“Pura, como na infância, abençoada
Pelo Santo entre os santos, Magdalena,
Que este era o nome da infeliz perdida,
Foge dos seus amantes opulentos,
Entrega aos pobres joias e riquezas,
Que Satan deparara, e mais formosa,
Descoberta a cabeça, os pés descalços,
Acompanha
o Senhor por toda a parte.” (67)
(67) FAGUNDES
VARELA, L. N. – in Anchieta ou O Evangelho nas Selvas – poema – Canto
III – Capítulo XXXIII – pp. 111, 112 – Livraria Imperial – 1875 – Rio de
Janeiro – Acervo: Academia Brasileira de
Letras.
O fariseu, rico de valores amoedados,
vendo que uma oportunidade rara de receber o rabi da Galileia batera em sua
porta, preparou-lhe uma recepção, a fim de se projetar no conceito dos seus
patriotas. E, assim, escolheu os músicos, os amigos e parentes para
recepcioná-lo.
O anfitrião estava interessado na
repercussão que teria seu nome como um amigo daquele homem que, se triunfasse
na política, conforme supunha, ganharia um lugar de destaque ao seu lado.
Aquele povo da Judeia estava ansioso
para ter um líder que viesse libertá-lo das algemas de Roma. E o Mestre,
possuidor de um poder enérgico e brando, sobressaía diante daqueles que
presenciassem suas atitudes elevadas. Até mesmo na singeleza de suas palavras
aos camponeses, havia nele uma dignidade que deslumbrava a todos.
Sabendo o que estava ocorrendo na casa
de seu antigo parceiro de noites de orgia, a pecadora teve a curiosidade de
conhecer aquele visitante que irradiava uma beleza comovente. Mesmo sem ter
recebido o convite, conseguiu penetrar no recinto onde estavam reunidos os
convidados. Tudo nela estava em desalinho, suas emoções, seus cabelos e suas
vestes.
Simão, acostumado às formalidades de
recepção, acolheu o ilustre visitante na tentativa de surpreendê-lo em público.
Mas a ternura da conhecida mulher era mais forte que os gestos externos de
pureza daquele fariseu.
Os minutos e as horas seguidas, naquele
ambiente, foram tomados pelas atitudes da pecadora que se libertou das sombras
do passado. Numa atitude piedosa e sentindo algo renovador dentro de si, deixou
cair lágrimas que se misturavam à água do vaso de alabastro que ela derramava
nos pés dele, enxugou-os com seus cabelos sedosos e os perfumou com essências
raras.
O fariseu, observando que tudo
acontecia sob a vista de todos os presentes, em pensamentos, zombou daquele
homem que estava em sua casa e disse só para si mesmo: “se este fosse profeta, saberia quem é a mulher que o
tocou, pois é uma pecadora”. (68)
Percebendo o que se passava no íntimo
do anfitrião, o Mestre amado inicia um pequeno diálogo com Simão. O evangelista
Lucas narra:
“Disse Jesus ao fariseu: “Simão, uma
coisa tenho a dizer-te. Respondeu
ele: Dize-a, Mestre. Certo credor tinha dois devedores. Um lhe devia quinhentos
e o outro cinquenta denários. Não tendo eles com que pagar, perdoou-lhes a
ambos. Dize-me, pois, qual deles o amará mais? Respondeu-lhe Simão: Tenho para
mim que é aquele a quem mais perdoou. Disse-lhe Jesus: Julgaste bem. Então,
voltando-se para a mulher, disse a Simão: Vês tu esta mulher? Entrei em tua
casa, e não me deste água para os pés; esta, porém, regou com lágrimas os
meus pés, e os enxugou com os seus
cabelos. Não me deste ósculo, mas ela, desde que entrou, não cessou de me
beijar os pés. Não me ungiste a cabeça com óleo, mas esta ungiu-me os pés com unguento.
Por isso te digo que os seus muitos pecados lhe são perdoados, pois muito
amou. Mas aquele a quem pouco é
perdoado, pouco ama. Então Jesus disse à mulher: Os teus pecados te são
perdoados.” (69)
(68, 69) LUCAS, 7:39 a 49
Uma sensação de espanto e admiração
corria nos olhos de Simão. Acostumado a
formalidades em que se evidenciam o engano, ele sentia dificuldade em
compreender palavras de libertação. Os
convidados à mesa começaram a falar entre si:
“Quem é este que até perdoa pecados.” (70)
(70) LUCAS, 7:49
A pecadora estava
convertida. O amor possibilita o encontro da verdadeira felicidade. Feliz,
sentiu-se realizada, e saiu como entrara: a correr, a correr...
W W W
O Canto III da obra Anchieta ou O
Evangelho nas Selvas, de Fagundes Varela também revela a narrativa poética
acerca da pecadora. Vale assinalar:
“Toda sua existência, e seu passado
Esquecidos, ressurtem!... A cabana
De seus honestos pais, os áureos sonhos
Da descuidosa e santa meninice,
O céu azul, as balsas florescentes
Os serões da família, e... sobre tudo,
Ai!... a inocência da primeira idade!
Crenças divinas que alimentam anjos!...
Tudo isto apareceu! de novo... ao longe,
À luz de um céu puríssimo, crivado
De milhares de estrelas refulgentes!...
Depois, volvendo os olhos a si mesma,
Examinando as nódoas indeléveis
Que de su´alma o espelho embaciavam,
Viu do colar as pérolas mudadas
Em lágrimas de fogo, e as ametistas,
Os graúdos rubis
dos braceletes,
Em quentes gotas de fervente sangue!...
Então sobre as espáduas da perdida
Rebentaram de novo as asas de anjo!
Em soluços desata, dolorosos,
Lança-se compungida
aos pés de Cristo,
De lágrimas e bálsamos os cobre,
E os envolvendo nas madeixas negras,
Os
enxuga, prostrada, arrependida.
XXXII
– Oh! não!...
murmura o fariseu consigo,
Este
mancebo zomba de nós outros!
Se ele fosse profeta, bem soubera
Quanto é rasteira e vil a criatura
Que pranteia a seus pés! – Jesus o encara,
E diz estas palavras: – Ouve, amigo:
Tinha um bom mercador dois devedores;
Um quinhentos dinheiros lhe pedira,
Outro apenas cinquenta; pobre ambos
Nunca puderam lhe pagar tais somas,
Ele, porém, as remitiu sem queixas:
Qual dos dois lhe devêra ser mais grato?
– Oh! certamente, o
fariseu responde,
O que maior quantia recebera! –
– Julgaste bem, o Salvador prossegue,
Estou sob teu teto, não me déste
Para lavar os pés um pouco d´água,
E nem déste o ósculo fraterno,
E nem minha cabeça perfumaste
De bálsamos suaves; entretanto,
Ela banhou-me os pés com tristes
lágrimas,
Ela os cobriu de beijos incessantes,
E os ungiu de perfumes preciosos!...
Por isso agora digo: os seus pecados
Remitidos estão, amou, e muito! –
E voltando-se à humilde pecadora,
Lhe diz: – Mulher, levanta-te, não
chores,
Pois a fé te
salvou! – Assim falando
Ergue-se e sai da sala do
banquete.” (71)
(71) FAGUNDES
VARELA, L. N. – in Anchieta ou O Evangelho nas Selvas – poema – Canto
III – Capítulo XXXI, XXXII – pp. 110, 111 – Livraria Imperial – 1875 – Rio de
Janeiro – Acervo: Academia Brasileira de Letras.
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