Num
clima tempestuoso em que se desenrola a Sonata n° 23, em fá menor, opus 57, Beethoven retratou, de
forma magistral, as paixões humanas diante da inexorabilidade dos fatos que se
impõem como as ondas do mar.
Os
sons harmoniosos e vibrantes expõem a ligação intrínseca do homem com o seu
destino que se revela em condições justas e exatas como o movimento allegro
assai que se desdobra nos
primeiros andamentos da Sonata.
Nesse
clima de alegria, as paixões humanas seguem à frente traçando rumos que se
recomeçam para compor o que sempre
estava faltando. Só o amor dá a plenitude.
As
paixões humanas são cavalos selvagens que correm mostrando força acima das
rédeas, buscando sempre a liberdade dos ventos. O compositor alemão igualmente
retrata o drama interior do
homem que busca, numa paixão
desenfreada, ser livre.
Como
os ventos, as ondas do mar, as tempestades de areia são forças que têm uma
direção, a Sonata nos revela a lógica evolutiva das formas temáticas,
harmônicas e rítmicas em que o compositor deixou ao mundo como lição de
beleza imperecível.
Os
desejos, que explodem numa paixão, buscam a felicidade, como as crianças
alegres caminhando entre perigos da rua. É o impulso maior da criatura humana
que luta para que tudo dê certo, embora não saiba o que realmente lhe convém.
Nas
caminhadas em busca da evolução, o homem se veste das mais diversificadas
roupagens e acolhe, se for inteligente, as circunstâncias que lhe dizem
respeito. Não precisa lutar por nada, porque tudo se lhe apresenta claro e
cristalino e, numa visão consciente, reconhece o que está incluído nesse jogo
de luzes.
As
imagens fluídicas da Sonata nos revela o turbilhão de pensamentos humanos
voltados ao campo do desejo e, numa visão distante, parece-nos que esses
pensamentos se transmutam na efervescência das abelhas fazendo o mel.
A
paixão é o ponto máximo do desejo. Nela tudo palpita, geme e chora como a
criança procurando os seios maternos e na separação dos sonhos que fugiram por
outros caminhos.
Assim
como não precisamos sacrificar um cavalo selvagem, mas domesticá-lo,
aproveitando suas forças, as paixões não devem ser extintas abruptamente, pois são
impulsos fortes revelando o destino. Busquemos a inspiração para saber por onde
devemos seguir.
Em
dois movimentos allegro da Sonata sentimos as paixões humanas, em busca da
felicidade, são amores que não esperam o amanhã, vivendo nas madrugadas o que
pode ser desfrutado à luz do dia. Transportando esse sentimento para o clima
nacional, a canção Beijo Sem, de autoria de Adriana Calcanhoto, na voz de
Teresa Cristina & Marisa Monte, retrata bem este perfil.
Nesse
clima de busca, encontro, desencontro e o encontro definitivo com os verdadeiros
amores, há uma jornada de tempo revelando as etapas que compõem o roteiro do destino.
Antes
mesmo do final da composição musical, sentimos que as paixões são amadas pelo
compositor como amamos o sexo e os anjos, o dinheiro e o desprendimento, o lar,
o trabalho, as leis e os costumes e a própria música como meios de nos
engrandecer cada vez mais no conceito que deslinda os enigmas do caminhar.
Nos
jogos das paixões e das situações adversas que não favorecem a sincronia do
tempo e espaço, nos sonhos que
pensamos ser sonhos, aceitamos o aparente fracasso como algo que não seria bom para o
nosso viver.
A
atmosfera do fiat voluntas Tua abafa todos os desejos, paixões, até mesmo o
decantado livre-arbítrio que se anula diante do Absoluto, em manifestações
multifacetadas que fazem girar as galáxias e abrem uma flor.
Beethoven,
o artista da transcendência, revelou, na mais convincente das artes, as paixões
humanas que caminham em direção do amor, como o trigo a caminho da mesa.
A
Appassionata é um dos grandes momentos da música, tão sublime como naquele
instante em que o homem passa a compreender toda a sua trajetória na Terra e
caminha inteligentemente ao estágio da angelitude, como fez Beethoven.
Beethoven,
um ser multidimensional, no momento atual poderia estar nas estrelas, mas
preferiu estar na psicosfera da Terra, acompanhando a luz crística retornando ao planeta. Não é dito que Jesus voltaria com
os anjos?
Beethoven, retratista das paixões humanas e,
acima de tudo, semeador do paraíso.
Blog Fernando
Pinheiro, escritor
Site
www.fernandopinheirobb.com.br
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