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domingo, 7 de outubro de 2012

CANTIGA DE VIÚVO



A Seresta n° 7 – Cantiga de Viúvo, de Villa-Lobos, para  canto e piano, foi escrita nos idos de 1926, na cidade do Rio de Janeiro. Posteriormente, em fevereiro de 1979, o compositor paulista Osvaldo Lacerda, o célebre autor da Suite Piratininga e de inúmeras músicas para canto, obras sacras, peças de orquestra e músicas de câmara, escreveu Cantiga de Viúvo, com a letra do poeta Carlos Drummond de Andrade. 

Refletindo o sonho, na praia do sono, a vida apresenta-nos estuante e bela, dentro dos arcanos que deslindam os enigmas do caminhar. O estado de vigília, numa alternância dormir e acordar, revela-nos diariamente os liames que estabelecemos em esferas subjetivas ou etéricas.

O poeta mineiro, ao escrever a letra da Cantiga de Viúvo, usou imagens ideoplásticas da alma humana mergulhadas nos  liames  que  tecem  o  destino  criado  até  mesmo  antes  que  o  homem abrisse os olhos. Eis, a seguir, o início do texto:
  “A  noite  caiu  na  minh'alma,
  Fiquei  triste  sem  querer,
  Uma  sombra  veio  vindo,
  Veio  vindo,  me  abraçou.
  Era  a  sombra  de  meu  bem
  que  morreu    tanto  tempo.”
Mesmo mencionando que “a noite caiu na minha´alma”,    o poeta não diz que teve um sonho; isto comprova que o estado  de vivência da alma, que ele sente, independente da condição  de sonhar no sono. Isto lhe permite entender a vida, na  informação da fonte de origem, nem mesmo tem a necessidade  de  consultar  os  travesseiros.

No sentido inverso, o homem que ainda não se desprendeu dos instintos grosseiros que o fazem criar uma atmosfera pouco inteligente, não tem condições de perceber que o seu mundo íntimo tem as revelações necessárias à sua caminhada como ser  inteligente à busca de sua identificação com a harmonia do  Universo.   

A esposa do poeta, falecida, conforme menciona a letra da música, veio ao encontro dele. Ela o abraçou com tanto amor, o apertou com tanto fogo e o beijou. Isto comprova que a morte,  como fim de tudo, não existe, e ainda nos dá a oportunidade de  refletir na continuação dos amores que se imortalizam. Nas óperas Navio Fantasma, de Wagner e Aída, de Verdi, esta fé é  demonstrada..

A canção diz que o poeta ficou triste sem querer. A tristeza que  ele sentiu era ainda aquela saudade e aquele vazio em seu coração pela partida da mulher amada. Acostumado com este sentimento, alimentado por recordações do passado. Quando ela sorriu devagarinho, certamente a  tristeza  desapareceu.

Aquele sorriso da mulher amada é o canto sem palavras que penetrou na alma do poeta. Isto faz-nos pensar na importância do amor, quanto mais intenso mais vivido. A alegria são raios cintilantes que se espalham pelas estrelas e que são devolvidos pelos amores nas noites de  esplendor.

No reencontro dos amores é desfeita a névoa densa que  impedia a visão de um panorama encantador. A alegria  confirma o sentido de amar, estende todas as virtudes que as religiões buscam passar aos fiéis e ainda enaltece a vida aos  sonhos do Criador.

Confiante nos segredos da Criação, a jovem mulher que partiu há tanto tempo (a alma que ama não envelhece, nem  morre) disse ao poeta um adeus com a cabeça, fechou a porta e saiu pela sacada, retornando aos jardins floridos da  espiritualidade que o seu coração plantou.  

Blog  Fernando Pinheiro, escritor

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