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domingo, 14 de outubro de 2012

CAPRICHO ESPANHOL


       A  suíte Capricho Espanhol, opus 34, do compositor russo Rimsky-Korsakov consta de cinco fragmentos sinfônicos, dentre os quais se destaca Cena e Canto Cigano que se desdobra em  ritmo de dança.

         Em tudo vemos a beleza resplandecer. Sorrisos de bailarina da dança-do-ventre, embalados por música que  inspira o amor e se perpetua nos clássicos.

         No estilo cigano a sedução é o cântico que chama a alma adormecida. A mulher gira a luz que cria sonhos e fantasias. Suas vestes escarlates se desdobram no ar como se fossem espumas do mar criando rendas na areia.

         Amante da liberdade, o povo cigano caminha levando a sua alegria aos tristes, a magia da sedução àqueles que não  acreditam mais na conquista amorosa.

         A arte cigana se espalha nas artes divinatórias, revelando a inspiração dos poetas e dos místicos, dos senhores do oráculo e dos profetas que enunciavam os tempos. Debaixo dessa ponte, há muita água a ser dividida. Não somos esotéricos porque a terceira visão ainda está mergulhada no plano mental nesta consciência trina que está indo embora do planeta.

         A dança cigana é beleza que se manifesta para desabrochar sorrisos como o vento brinca na areia do deserto para mostrar que é mais forte que a ameaça da destruição.

         Alma cigana. Quem tem a alma cigana? Quem dança na luz? Quem ama acima de toda ameaça? Quem acredita no amor em festas, nos sorrisos e nas mãos que espalham ternura, sacudindo vestes que desdobram cascatas, cascatas de rendas?

         Ainda numa visão poética, essas vestes são asas de borboletas voando nos jardins ou são mesmo cascatas de águas espumantes que caem no solo e se levantam desfazendo-se no  ar, num mergulho dos sonhos.

         O ritual cigano prepara o momento do enlevo que sacode a alma adormecida e a encaminha para seus sonhos de ventura.

         Se as estrelas no céu refletem luz que brilha sem apagar,   o encanto cigano revela o amor se agitando nos sorrisos e no sacudir do corpo da bailarina que espalha a sedução.

         A dança é um gesto do corpo, como o andar, o cantar, o ouvir e o ler. Não vamos dar peso e referência a quem a aprecia de modo diferente. 

         Davi dançou diante da arca e deixou versos que perpetuam os salmos, Salomé deslumbrou os olhos do rei num bailado que ficou na História e, na cultura oriental, a mulher dança antes  de se entregar ao seu amado.

         A soprano Maria Ewing, uma das mais belas Carmem, papel–título da ópera que encantou o Metropolitan Opera House de Nova York, nos Estados Unidos, encantamento que se espalhou pelo mundo, interpretou Salomé de Richard Strauss, onde no palco deixou cair, cumprindo o script, a roupa que a vestia, no espaço de segundos que a música não deixa os  ouvintes notar a nudez relâmpago.

         O ballet clássico tem o vigor da música que lhe dá cobertura, em vibrações sonoras que se eternizam como a  beleza nas artes e nos sentimentos que revelam o amor.

         A bailarina cigana dança músicas de um cultura que não deixa o amor se apagar, num momento tão agitado por  vibrações perturbadoras que passa o planeta inteiro, nos poucos anos que antecedem ao choque da humanidade.

        Refletindo na missão que todos possuem, nos mais diversificados níveis da cultura, ficamos a imaginar como é bonito o gesto daqueles que espalham sorrisos e alegria àqueles que buscam apenas um pequeno impulso para se sentirem  felizes.

Blog Fernando Pinheiro, escritor

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