Páginas

quinta-feira, 2 de agosto de 2012

IRREMEDIÁVEL CANÇÃO

Com o movimento lento, a Irremediável Canção, de Cláudio Santoro, escrita para canto e piano, traz os versos de Ary de Andrade, o autor de Balada de Campos do Jordão  (1942), Canto do tempo presente (1946), Poemas de mãos      calejadas (1951), Café Society (1955), Romance das estradas (1971).

        Cláudio Santoro (1919/1989), professor, compositor,  violinista,  maestro,  fundou  e  regeu  a  Orquestra  Sinfônica  do  Teatro  Nacional  de  Brasília,  morreu   no  palco do  teatro, hoje denominado Teatro Nacional Cláudio Santoro, no  momento  em  que  estava  ensaiando  o  Segundo  Concerto para  piano  e  orquestra,  de  Brahms.

        Comentar  a  letra  que  a  música  embala  lentamente  é colocar a poesia em dois cenários completamente opostos:     um céu de beleza indescritível e um inferno que buscamos,       o mais possível, silenciar. As paisagens íntimas que o         poeta  sentiu  na  mulher  amada,  vê-se  no  final  mergulhada  em  profundo  abismo.

        Quando o despertar de um romance começa, há sonhos  que imaginamos serem sonhos, talvez pela vontade de  sentirmos  que  a  pessoa  amada,  depois  não  amada,  estar no mesmo sentimento que vivemos. É claro que a beleza     física  da  mulher  inspira-nos  ao  enlevo  dos  amores  eternos.

        O letrista criou um clima de colorido poético, onde  destaca a leveza e a mansuetude no olhar da mulher       amada, comparando-a ser ela feita de luar. No envolvimento  amoroso, a paixão desenfreada invade o terreno das     sensações em que o corpo se entrega aos prazeres sensuais.     O silêncio da mulher amada encobre, momentaneamente, a  realidade  em  que  ela  vive  e  a  luz  que  ele  viu  no  sorriso  dela  se  espalha  pelas  estrelas.

        Em  resumo,  em  seu  idílio  amoroso,  ele  a  cantou  em  versos  que  a  compara  também  com  a  fonte,  a  música,  a  praia,  o  mar,  tudo,  enfim,  que  inspira  luz  e  calor.  Esse amor  não  foi  correspondido  nessa  mesma  intensidade. Almas  incompatíveis  se  debatem  intimamente,  de  abraços em abraços, mesmo que as aparências sejam envolvidas no clima  de  amor.

        Há um tempo–limite na espera dos sonhos acalentados, não bastam apenas colo e perfume, abraços e ternura,  respiração   mergulhada  no  orgasmo  e  deleite;   os   jogos   da lua-e-dos-ventos são bastante concorridos e requerem         uma preparação não apenas física, mas principalmente      emocional.

        O tempo se encarrega de nos entregar aquilo que   pertence  ao  nosso  destino,  assim  vão-se  embora  os  amores  que pensamos ser verdadeiros, e vêm-nos, para nossa  felicidade,  os  amores  que  muito  têm  a  ver  com  a  nossa  alma,  sem  esquecer  que  os  atrativos,  que  nos  encantam,  têm   igualmente   um   papel   muito   importante  em  nossa   vida,  não  exclusivamente  primordial.

        O passado amoroso que não traz nenhuma recordação agradável deve ser esquecido, sem, no entanto, menosprezar  quem  para  nós  foi  praia  e  mar,  fonte  e  música,  deixando  que outros ventos, que não precisamos saber de onde vêm,  levem  aquele  amor  que  não  vive  mais  em  nosso  coração.


Blog  Fernando Pinheiro, escritor
Site   www.fernandopinheirobb.com.br

Nenhum comentário:

Postar um comentário