CANDURA
Escrita nos movimentos musicais muito devagar e com verdadeira unção,
legato e simplice, crescendo, diminuindo, com elevação, declamando com
suavidade e com elevação, morrendo em pianíssimo, a música Candura, de Alberto
Nepomuceno, tem um poema de Radindranath Tagore, adaptado para o português pelo
tradutor Plácido Barbosa (1871/1938).
A consagrada poetisa Cecília
Meireles, numa conferência sobre a vida e a obra de Tagore, realizada na ABI -
Associação Brasileira de Imprensa, declarou: “A poesia tagoreana conduz a uma
visão de santidade, de serenidade, na contemplação geral.”
A letra da música inicia
revelando gestos delicados que envolvem ternura e carinho entre os namorados:
“as tuas mãos nas minhas mãos, os meus olhos nos teus olhos, assim começou o
nosso amor.”
Hoje em dia, quase não se vê os
casais andar de mãos dadas, nem olhar nos olhos, talvez para não demonstrar em
público o compromisso entre eles. A tendência atual dos namorados é ficar ou
namorar, não há alternativa.
O carinho alimenta o namoro; as
mãos, os olhos emitem vibrações sutis que afaga, anima, dulcifica e extasia o
nosso coração, uma sensação de voo leva-nos ao estado emocional de leveza e
sentimos vontade de voar mais longe, como pássaro abrindo o espaço.
Voar juntos, em sonhos
acalentados, o êxtase é ainda muito maior como a sensação de orgasmo que não
pode ser sentida isoladamente. Compartilhar a nossa energia dulcificada nas
emanações sutis que o amor nos inspira é viver duplamente, corpo e alma.
O cenário ajuda-nos a viver esses
momentos inefáveis. No clima romântico, que criamos, pode haver lua cheia ou
outras fases da lua e o ambiente adequado ao encontro amoroso, de uma cabana a
uma moradia onde o requinte e o luxo se ostentam.
A letra da canção revela a
claridade perfumada nos sentimentos dos amores. A atmosfera de amor, que os
enamorados criam, tem luar, flores se abrindo, perfume no ar, silêncio que
revela tudo correndo como os rios em direção ao mar e nossos pensamentos
criando situações estáveis que constroem o lar, o refúgio que buscamos imitar
do ninho de pássaros.
Quando os pensamentos inspirarem
a beleza da rosa, podemos dizer que são pensamentos perfumados. O vidro de perfume
acaba com o uso, mas o perfume que colocamos nos sentimentos de amor nunca
termina, pois a fonte é inesgotável, isto porque colhemos do amor universal que
se espalha em todas as coisas que existem.
A letra da canção também nos diz
que a pureza do amor prende-nos os olhos e enaltece o elogio como forma de
estímulo maior. Elogiar a beleza é criar uma atmosfera azulada onde o nosso
amor flui com ternura e intensa emoção.
A música Candura finaliza num
contexto social que sobressai a luta pela sobrevivência, onde o relacionamento
de casais consegue ultrapassar obstáculos que influenciam o estado d'alma de
quem ama e busca o amor correspondido: “E nos buscamos e nos fugimos, doces
lutas simuladas, risos... timidez... Como é puro este nosso amor.”
Blog Fernando Pinheiro, escritor
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