A MORTE E A DONZELA
Na canção A Morte e a
Donzela, de Schubert, o significado da morte está associado à palavra dormir.
Assim, longe da ideia do vazio ou de perda, todos os dias o ser humano morre
parcialmente para viver experiências profundas.
A morada do homem é o paraíso.
Ele passa dezesseis horas em estado de vigília e começa a sentir cansaço. Mais
algumas horas torna-se insuportável ao seu corpo físico. O sono é inexorável e,
então, adormece.
Nessas horas de repouso, volta ao
paraíso, onde tem suas raízes milenares. Lá encontra seus verdadeiros chefes,
seus amores de laços que o tempo terreno não conta mais. Recebe, então, a
orientação segura do seu viver e vê o vale da sombra e da morte um ponto
minúsculo a se perder no espaço.
Os perigos que ameaçavam sua
tranquilidade nessas paragens não o atingem. O voo nas esferas do paraíso, que
a realidade tangível classifica como um voo nos sonhos, tem a emancipação
parcial do homem que deixa uma pequena percentagem de sua alma no corpo físico.
Como a parte mais importante do
homem é a força que o envolve, ele precisa diariamente se alimentar das
energias cósmicas que se encontram em regiões não contaminadas.
Nessas paragens de comovente beleza, vê a realidade das
circunstâncias que une as pessoas; os motivos estabelecendo ocorrências em que
está envolvido e as razões por que algo lhe desperta a atenção.
Diante dos fatos que lhe trazem a
explicação dos enigmas, que até antes não os compreendia, vê em tudo uma
ligação promovendo o equilíbrio daquilo que estava oscilante.
No longo percurso da sua caminhada, o homem tem
necessidade de confirmar a manifestação do ser etéreo, que ele é, em todos os
seus gestos e atitudes, pois nada acontece no universo sem os ditames de uma
lei maior.
Na incompreensão daqueles que
veem os transtornos saindo das mãos dos opressores, confirmamos que há sempre
um vínculo unindo as pessoas, independente de circunstâncias agradáveis ou não.
O universo inteiro está
mergulhado em movimento.
As estrelas viajam no espaço recebendo e espalhando luzes de
sóis que se multiplicam da noite para o dia e até mesmo num piscar de olhos. As
galáxias e as nebulosas estendem cenários em viagens que não terminam nunca.
São tão pequeninos os embaraços
humanos se compararmos com as possibilidades que estão à disposição de todos
para se engrandecerem diante do cenário da vida cósmica em movimento.
Precisamos entender, de vez, que
não pertencemos à Terra, do mesmo modo que o mergulhador de plataforma
submarina reconhece que não mora no fundo do mar. Estamos de passagem em missão
peculiar às características do ambiente onde vivemos.
Como temos ainda laços com o
planeta, que se estendem pela incompreensão daqueles que se decepcionaram com
os nossos gestos, retidos nas noites do tempo, precisamos aproveitar a
oportunidade para demonstrar a eles o nosso amor, em silêncio ou nas palavras.
Divulguemos aos tristes que, na música
a morte é vida, como a crisálida que desperta a borboleta. A Morte e a Donzela,
de Schubert, Pavana para uma princesa morta, de Ravel, O Cisne de Tuonela, de
Sibelius, e tantas outras expressões de beleza transcendente, são momentos que
retiram a ressaca do homem a caminho da angelitude e o envolvem com a roupagem
das estrelas.
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