Escrita para
canto e piano, em 24 de setembro de 1988, na cidade de São Paulo, a música Por
Quê?, de Osvaldo Lacerda, inicia-se
em movimento crescendo poco a poco,
diminuendo poco a poco, menos movido, ainda um pouco menos triste, e
finaliza em pianissimo marcato.
O
renomado compositor Osvaldo Lacerda (1927/2011) presidiu as
seguintes entidades culturais: Sociedade Paulista de Arte, Sociedade Pró-Música
Brasileira, Centro de Música Brasileira,
de São Paulo – SP.
Os
versos do poeta Guilherme de Almeida (1890/1969), imortal da Academia
Brasileira de Letras, contidos na música, fazem perguntas à mulher amada.
É
completamente impossível responder aos versos do poeta, principalmente porque
as perguntas são endereçadas à mulher amada, nem ele próprio e nem o compositor
conseguiram. Aliás, é mister dos dois artistas manter a pergunta no ar.
No
entanto, depois do fraseado musical que acabamos de comentar, cabe-nos a tarefa
de analisar o texto sob o aspecto filosófico, ricamente estruturado em
metáforas que invadem o campo
sentimental e nos revela a interioridade da alma humana.
Há
o encontro de um casal, à hora morta da noite. Ela o espera
e abre a
porta, corresponde ao sorriso que
acabara de receber e a rosa é segura pelas suas mãos. Depois, acende a
lâmpada e a lareira, estende a esteira; fecha a porta, tira os brincos, solta os cabelos e tira o
cinto de couro.
A
hora é de entrega. O leito estendido à espera dos jogos amorosos. Os olhos são fechados, a boca
é aberta. Beijos de bom–bom, tão bom! Doces e aromatizados, perfume de mulher,
essências aromáticas se misturam numa atmosfera criadora que somente os pássaros possuem.
Fantasias
pré-concebidas se misturam com a improvisação de carinhos que nascem na
movimentação dos corpos febris e ardentes. A alma dos amantes se descontrai em
eflúvios como as cachoeiras derramando águas pelo rio abaixo.
Névoa
de sonhos se estende nos pensamentos contemplativos da beleza, como se fosse a madrugada
cinzenta correndo afugentada
pela luz do alvorecer. A névoa
é o corpo e a luz do alvorecer é a alma. O rio abaixo é a vida que se estende
pelos caminhos infinitos. A
água é a
sabedoria do viver.
Quando
a vontade dos amores e o destino não se
completam, ocorre sempre o
adeus, mesmo aquecido por horas febris no
calor dos sentimentos. É muito comum, o encontro amoroso, em uma ou outras vezes, seguido de uma
separação.
Não
há fracasso porque a voz do
destino ecoa por último, e é sempre determinante, até mesmo contra a vontade de
quem gostaria de permanecer
junto a alguém.
O
poeta Guilherme de Almeida, o artista do verso, enriquece o canto de Osvaldo Lacerda,
no momento em que o encontro
de casais passa a ser o
centro de referência para formação de uma família e a união de casais que
buscam uma troca de experiência no
campo sentimental.
As
últimas perguntas à mulher amada entram no campo subjetivo: “Por que ouviste o que eu não disse? Por que
disseste o que não ouvi? Arriscamo-nos a dizer que ela percebeu mensagens, via
pensamento ou gestos, que lhe diziam a
verdade da alma. E nem precisava ele dizer o que para ela já estava decidido.
A
mulher amada ficou de mãos dadas na despedida porque o último momento teria que ter o carinho
feminino que permanecesse acima da
saudade que ele, certamente, iria,
mais tarde, sentir. O carinho que ela manifestou, no adeus, já não era sensual,
apenas amigável, porque ela já estava apaziguada com os sonhos que ainda não
apareceram, os sonhos do verdadeiro
amor.
Blog
Fernando Pinheiro, escritor
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