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sexta-feira, 21 de dezembro de 2012

O OLHAR DE BEN-HUR

Picture from Ben–Hur (movie): actor Charlton Heston looking at Christ 
 No cenário de morte a vida resplandecia. O vento da tarde sombria espalhava o perfume dos campos floridos de açucenas, margaridas e boninas. As folhas soltas rolavam como se fossem os sonhos dos triunfadores da espada.
O olhar de Ben-Hur era de total admiração e deslumbramento. Nunca sentira antes nada igual, nem mesmo quando pisou o tapete vermelho ao ser recebido por César não vira nele qualquer traço que lhe despertasse a alma adormecida. No entanto, um homem simples e nobre, erguido numa cruz, mostrou-lhe a maior de todas as conquistas.
Lentamente dirigiu-se a Ester, a esposa que o acompanhava, e lhe disse num sussurro comovente: “senti que a voz dele tirava a espada de minhas mãos e o ouvi falar: Pai, perdoa-lhes, eles não sabem o que fazem”. 
(117)  CHARLTON HESTON (1923/2008) – in Ben–Hur, a cena do  Calvário, dirigido por William Wyler, filme que obteve 11 Oscars da Academia de Hollywood, tendo como protagonista principal Charlton Heston no papel–título que lhe rendeu, em 1959, o Oscar de melhor ator. No Brasil a dublagem da voz do ator Charlton Heston foi realizada por Márcio Seixas que, em entrevista realizada em 21/1/2007, no canal de televisão da Rede Net – TV Veiga de Almeida, declarou que o olhar de Ben-Hur a Jesus Cristo foi uma das cenas mais impressionantes que já viu em cinema. 
Toda a juventude de Ben-Hur foi movida pela represália. Nos jogos do destino, esteve prisioneiro nos embalos da galera, remando acorrentado numa trirreme romana. Ao resgatar a vida do cônsul Quintus Arrius de um naufrágio, ocorrido durante uma batalha naval, foi acompanhá-lo a Roma para receber de César as honras de triunfador de guerra.
Com o prestígio adquirido, o príncipe judeu volta as terras do Levante para competir e derrotar, na arena de Cesareia, o  tribuno Messala, o amigo de infância que se transformou em  inimigo implacável. 
(118)A cena da corrida de bigas, no filme Ben–Hur, é considerada, pela crítica e pelo público, o ponto máximo do cinema.
Agora, no Calvário, ouvindo as palavras de perdão, sente-se mais próximo dos ideais que sonhou e respira fundo para reter algo mais do que o ar, a mente fica mergulhada na plenitude.
Ben-Hur sentiu em Jesus a amizade que o seu amigo de infância não teve condições de demonstrar, na gratidão do cônsul que lhe dera o nome de pai e protetor, mas dentro dos limites humanos, na oportunidade de servir aos ideais nobres que o imperador romano pouco tinha para oferecer.
O coração desse jovem príncipe judeu era tão pequenino para receber tanto amor. Até aquilo que chamam de milagre ele conheceu: as energias da saúde que saíam de Jesus se espalhavam, como os ventos dos campos floridos, beneficiando os enfermos. Ele olhou ao redor e viu seus familiares curados da lepra. Seus olhos se iluminaram na luz que vinha da cruz e uma alegria invadiu-lhe o ser.
Naquele momento de comunhão com as esferas resplandecentes, onde gravitam as energias que movem as estrelas e tendo em Jesus a ligação maior, o paraíso parecia arder, mas aqueles que estavam sintonizados no amor sentiram o significado profundo da vida.
O olhar de Ben-Hur era o reflexo do olhar de Jesus. Agora, estava vendo a intimidade das rosas, dos ventos, do coração do  homem,  da  grandeza de Jesus que veio ao mundo sem ter a necessidade de usar o emblema da águia romana, embora  respeitável.
Quantas caminhadas foram encurtadas em apenas um passo que deu em direção do homem crucificado! Quantos sofrimentos foram retirados do caminho que Ben-Hur buscaria encontrar, estoicamente, nas oscilações do prestígio e da glória!
O jovem príncipe ficou em silêncio por muito tempo, pensando naquele olhar profundo que lhe revelou a sabedoria dos valores, os que passam e os que ficam mergulhados no tempo, reacesos na  lembrança dos amores eternos.
Alguns soldados romanos não sentiram a atmosfera azulada que fazia ponte entre aqueles que amam verdadeiramente e Aquele que é o próprio amor.
Um instante depois, uma túnica foi rasgada e distribuída à sorte. Quem a ganhou, perdeu uma oportunidade de refletir sobre a vida. Um sorriso pareceu abafar o silêncio e risadas soltas pelo ar seguiram o caminho das oscilações.
Um desses soldados, que presenciou a cena trágica do Calvário, era Demetrius. Ele tocara as vestes de Jesus. Mais tarde, tornara-se amigo de Pedro, o apóstolo. De volta a Roma, o imperador o nomeia tribuno, lotado na guarda pretoriana, devido ao combate em que saiu vencedor ao derrotar 30 homens armados na arena do Coliseu. No Palácio, torna-se amante de Messalina, a linda cortesã que tirava onda de sacerdotisa de Ìsis para granjear prestígio e poder.
O destino fez com que ele tocasse, pela segunda vez, o manto sagrado em destroços. O imperador romano encarregou a ele a missão de trazer para o Palácio a relíquia. Graças a interferência de Pedro, que evitou o iminente derramamento de sangue, Demetrius cumpriu a missão diante de uma circunstância em que a fé sobressaía acima das aparências físicas. Um antigo amor da primeira hora, uma linda jovem, mergulhada no efeito de um forte trauma, ocorrido semanas antes em que ela o viu ser levado pela guarda pretoriana, conseguiu despertar, graças a fé exteriorizada no tempo em que passou coberta pelo manto.
O imperador Calígula, de posse do manto sagrado, cometeu uma atrocidade ao mandar assassinar um prisioneiro, com o objetivo de testar o poder miraculoso das vestes. Sem a fé, logicamente, o milagre não ocorreu.
De volta para casa, Ben-Hur caminhou por um riacho onde deslizavam águas cristalinas. As pedras limpas e lisas eram como homens que podiam mudar de lugar e aquelas outras nas rochas, seria necessária uma explosão para desprender do sono adormecido da consciência e depois  caminhar, simplesmente caminhar.  

Blog Fernando Pinheiro, escritor
Site  www.fernandopinheirobb.com.br

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